O cotidiano do meio
No meio do caminho havia uma pedra.
Assim o mundo começou, uma coisa sempre no meio da outra. No meio da rua há
tudo e nada. No meio da rua tem vida. No meio da rua tem violência, tem
conversa, tem história, música, poesia, barulho, pessoas. Na madrugada, no meio
da rua não tem nada. No meio da madrugada tem silêncio se o telhado de sua casa
não for um motel de gatos. No meio dos livros havia Nero e no meio de Nero
havia fogo. A vida não tem metade e mesmo que tivesse não seria bom viver meio
período entre nossos entes queridos.
No meio de Luiz Gonzaga havia uma
sanfona, no meio de Brasil Gonzaga apareceu e criou o Baião. No meio, na
frente, do lado do Tom há sempre o Jerry. Para a infelicidade de Seu Madruga,
Dona Florinda sempre esteve em seu meio social. No meio de tudo há o Papa
Léguas. Meio quilo de arroz alimenta metade de uma família. Nove e meio não é
dez, pode até ser arredondado, mas esse meio não foi mérito seu. Não existe meia maçã na gramática portuguesa,
mas existe a banda de uma maçã no vocabulário popular. Meia hora pra dormir. No
meio do sono há um despertador. O tempo não para, então não venha com conversa de
que quando está com a pessoa amada as horas param.
No meio do coração de cada “coroa”
pulsa o sentimento de lembrança da juventude. No meio da serra existe o vento
mais puro do universo. No meio do Mar, em Boa Viagem, tem Tubarão e a cada 500m
da praia há um aviso de “perigo” bem no meio da nossa visão. No meio do cinema sempre tem um, dois,
três... incontáveis folgados. No meio do
relógio há os ponteiros que determinam sua vida. No meio da barriga há uma
cicatriz que aparentemente não é cicatrizada. A metade da laranja está no meio
da multidão, por isso que é tão difícil de achá-la. Pior do que não achar a
metade da laranja é pensar que achou. O meio como se fala pode significar o
começo ou o fim. O meio é a mensagem. Quando achamos que já estamos no fim da
missão, ainda estamos no meio. A meia do pé direito de Tom é furada por que a
unha do dedo do meio rasgou. No meio de toda família há aquele parente que
tenta estragar o todo. Mais ou menos é meio, nem mais nem menos. O meio fio é
um fio solto no canto da rua.
Ao meio-dia as pessoas comem. Se não
tiverem comido estarão com fome. Meio-dia e Meia-noite tudo é meio diferente.
Novos personagens, novos elementos e você no meio de tudo isso ou no meio do
sono. Enquanto você está no oitavo sono à meia-noite e ao meio-dia você está
almoçando, há alguém jantando a meia-noite e acordando ao meio-dia. Onde eu
estou não é nem a metade de um todo, considerando o mundo. Mas, para mim é como
se fosse o meio do mundo. Só que nem sempre o meio é o centro. Se intrometer é
entrar no meio ao qual você não foi convidado.
Mas se intrometer pode ser o início de uma história. A história é feita
de intromissões, que deram certo ou não, mas são contadas nos livros. E a
melhor história sempre fica no meio.
Estar no meio para entrar no meio,
assim funciona a vida por aqui. O índice é o meio mais eficaz de se descobrir
se o livro é bom ou não, se os títulos forem meio chatos o leitor não chegará
nem na metade. A metade de um filme é a melhor parte, pois está mais próximo do
final. Quando estiver no meio do mar e não souber nadar, sorria afinal você
conseguiu uma proeza, mar tem meio? E só depois de sorrir, aí você se desespera.
Às vezes os diálogos fingem acabar e acabam pela metade. O término do diálogo
não tem fim. No meio do nada tem alguma coisa. Na capa do disco, os Beatles
caminham no meio da faixa de pedestre. Na Central do Brasil o único meio é a
escrita. No meio da turbulência o ideal é se sentir nas nuvens.
Depois de uma ressaca não se sinta meio
canalha, sinta-se totalmente um babaca, por que você vomitou no meio da rua,
dormiu no meio da praça e não lembra nem de metade da meia – noite do dia
anterior. Fazer promessa pode parecer meio idiota, já que Deus não está
procurando recompensas por você ter determinado um período “santo”. Para cada
ação existe uma reação diferente há que se imaginou, mas no meio da confusão
não dá pra pensar na reação mais digna. Por fim, dizem que os fins justificam
os meios, então já sabemos do fim antes mesmo de chegar ao meio e aos meios
utilizáveis. Então não venham culpar o meio por que o meio sempre foi e sempre
será neutro.
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