Dedicatória


            Toda manhã pergunta se quero tapioca e diz que tem café. Se ficar ali na cozinha a conversa se alonga até a hora do almoço. Agora, ela não coloca mais minha comida por que tive que diminuir na quantidade e mudar o tipo de prato, de fundo para o raso. Certa vez, confundi o prato que ela preparou com uma montanha. Acorda cedo e debulha feijão, vai à rua, ajuda quem a procura, se preocupa e quando estou de saída se despede com um “Boa sorte” e que “Deus acompanhe”.

Vejo nos olhos dela uma felicidade sincera. Uma felicidade que uma mulher só é capaz de esboçar depois que passa pela tal experiência de ser mãe. E toda vez que eu saio de casa imagino o quanto ela fica aflita, por que o mundo não sabe o amor que envolve aquela aflição e no mundo falta exatamente o que tem de sobra pra ela. É que no mundo, na maioria das vezes, há aflição, mas não há amor suficiente pra compensar.

           Ela confia, ela acredita, ela trata você como um bebê, ela te carrega, defende, te alimenta, ela vive por um único motivo: a felicidade de sua eterna criança. Quando chego em casa, por volta das 23:00, vou para o cômodo do final da casa e debulho todas as histórias no ouvido dela. Ela às vezes escuta com paciência, em outras cai no sono e em outras vezes pede pra apagar a luz por que está cansada e precisa dormir. Ela tem olho biônico, uma coisa fora de lugar e pimba!, num é que a danada encontrou! E durante 12 anos da minha vida ela me levou ao banheiro com uma chinela na mão e convenhamos ela tinha razão, era preciso tomar banho.

         Sempre foi rigorosa em relação aos estudos. Um sete em matemática não gerava um parabéns ou um “tá evoluindo”, gerava um “se tivesse estudado mais poderia ter tirado um dez”. E ela estava certa. Eu disse que queria viajar sozinha pra aprender a me virar, ela disse que ia comigo. Assim que entramos no ônibus agradeci por ela ser tão insistente e ter ido. Ela reclama do pé sujo no sofá, reclama do barulho, reclama pela falta de atenção, reclama porque a garrafa de água está seca dentro da geladeira... Reclama com razão, clama por amor, esbanja carinho. Minha mãe é assim: tapioca com amendoim, baião de dois, café quente... Ela é um manancial inesgotável de afeto.

Comentários

  1. Estou lendo suas coisas, pasmo e admirado com tanta sensibilidade. Que bom! Você deve enfeixar essas crônicas e fazer um livro que vai ser sucesso entre os jovens, os que gostam de uma boa leitura, ou entre os velhos saudosistas. Tenho uma filhinha de 10 anos e gostaria que ela pensasse assim, como você nessa crônica à sua mãe.

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